Crítica/Opinião

Gil Cruz, os meandros da cor

Assisti ao começo da carreira deste autor. Na altura dominava-o o fascínio pela descoberta dos efeitos plásticos dos materiais e o prazer da cor. A importância era dada a tintas, suportes e técnicas. Os resultados haveriam de surgir sob as leis do acaso ou como consequência de acidentes de percurso a merecer um outro olhar. Muitas obras se realizaram à maneira de Pollock, muitas outras nasceram como tal e foram, posteriormente, disciplinadas à força de rolo ou renovadas pela propositada exaltação das diferenças.

Começar em artes plásticas é um tanto como abrir uma caixa de Pandora. Nem se pára nem volta a ser possível o alheamento deste mundo onde sofrer é aceder ao desconhecido de que, em última instância, somos a origem e o destino. Nasce-se Pintor? Fazemo-nos artistas? Tenho para mim que uma vez descobertos os talentos a sua evolução é uma consequência do esforço e da procura em exercícios de meditada solidão. É na intimidade criativa que a luz acontece, as trajectórias se dilatam e que nos chega, pelo fazer, o direito a caligrafia pessoal e discurso autónomo.

Com Gil Cruz não foi diferente. As descobertas sucediam-se à medida que a familiaridade com os materiais crescia e em função das suas potencialidades. A cor, primordial nos seus registos, tornara-se empolgante. Já não existia sem os limites que, balizando os pigmentos, geram a forma, a compartimentam em mil porções de realidade onde as composições  se rebelam contra simetrias e equilíbrios convencionais.

A abstracção determinada cedeu passo à ambiguidade formal e esta, propicia o aparecimento de uma figuração tímbrica, imbricada em polivalências que admitem muitas leituras e onde, sem surrealismos forçados, é fácil conjugarmos o interior restrito com os vastos espaços de uma realidade exterior em leituras igualmente consistentes.  A pintura assume-se, então, como uma narrativa imprecisa, atomizada, capaz de responder a sonhos e devaneios mas ainda apta a sugerir ao observador os valores de uma plasticidade que se cumpre na lata atmosfera aparentemente informal.

Escondida a essência desta pintura em cromatismos de muita vivacidade, importa referir que a emoção se impregna à medida que a construção dos espaços ganha corpo, como se brotasse, pura, em fragmentos de um puzzle que a si mesmo se reinventa.

Sintra, Outubro de 2010
Edgardo Xavier
A.I.C.A. Portugal






Gil Cruz sob o olhar crítico de Edgardo Xavier

Resultado de uma determinação que apenas radica no seu gosto palas cores, texturas e ritmos, a pintura de Gil Cruz é sempre um acto de reafirmada ousadia perante um universo percepcionado e vivido como fascinante.
A Arte como registo de automatismos gestuais é o “primus movens” deste trabalho que se valida pelo rigor da selecção subsequente. Usando, então, de espírito crítico, distanciamento e boa noção de equilíbrio, o autor escolhe enquadramentos, redimensiona as composições, exalta os cromatismos e aporta depois de uma trajectória invariavelmente emocionada, à obra final.
Hans Hartung e Polock são algumas das referências que tutelam a postura de Gil Cruz perante a necessidade de comunicação visual e plástica. Assim, recuperando valores e gnoses que ajudaram a construir os novos conceitos da Arte Contemporânea, este pintor persegue a essência que preside à formação das imagens, independentemente do seu sentido estético ou do seu poder interventor no contexto da sinaléticas de hoje.

1997
Edgardo Xavier
A.I.C.A. Portugal

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